Muito tem sido comentado nos últimos anos sobre a inserção das tecnologias digitais na educação escolar com vistas a aprimorá-la e torná-la, por sua vez, mais interativa. Em entrevista ao Jornal O Povo em 27.09/2011 o sociólogo e professor da Universidade Federal do Ceará André Haguette versa sobre a díade tablets-livros.
Creio que a posição de André Haguette em afirmar que tablets não substituirão livros apresenta coerência a partir de um impacto discursivo metafórico e contundente, especialmente quando afirma que "A diferença é que o livro gera uma leitura quente, enquanto os e-books são mais frios. O gosto pela leitura é diferente no livro porque você pode folhear, cheirar. Mas é possível que a próxima geração não tenha esse prazer”.
Haguette toca em um ponto muito salutar que é o ideário de intensidade e envolvimento com a leitura. É crível que as tecnologias digitais contribuem para o processo educativo, mas não em uma escala de substituir livros (pelo menos não da forma arbitrária como pregam alguns). É preciso ponderar que o livro também é uma tecnologia e, como tal, não deve ser subestimado como instrumento dinâmico de educação.
Na verdade, ao invés de discutirmos sobre as mudanças de suportes tecnológicos, deveríamos discutir sobre o nível de leitura, escrita e, principalmente, de incentivo a pesquisa de nosso corpo docente e discente, desde o ensino básico até o ensino superior, que parece ser tão pouco incentivada no Brasil.
Os movimentos e órgãos educacionais devem promover um olhar cauto para este processo, uma vez que essa suposta mudança não pode ser vista apenas como um fenômeno de evolução tecnológica, mas sim como um instrumento de aperfeiçoamento dos suportes para educação.
Ao meu ver, os tablets e outros instrumentos tecnológicos digitais estão vindo para somar e auxiliar na construção de uma educação mais interativa e produtiva. Todavia, de nada adianta pensar em produtividade por meio dos suportes tecnológicos, se o principal não está em pauta: O VALOR INFORMACIONAL que possui cada documento, seja ele digital ou impresso. O valor da informação agregado a um incentivo político, social e humano é que contribui para o aperfeiçoamento da educação, pois a informação se constitui como indício de interpretação, compreensão e produção de sentidos no contexto educacional.
O que me preocupa, como diria Waldeck Carneiro da Silva (1995) é o silêncio dos bibliotecários no tocante a essa e outras questões. Acredito que a Biblioteconomia possua força intelectual e política a partir de seus pesquisadores e órgãos de classe para se posicionarem diante desse processo, de modo que mostre um olhar mais cauto e incisivo no tocante a educação privada e pública, principalmente apontando perspectivas, limitações e tendências do valor informacional presente nas tecnologias digitais e impressas. Neste caso, ainda mais a educação privada que tornou-se um "berço mercadologizado" sem uma efetiva preocupação humana e social. Isso só mostra que o Brasil é um país que cresce economicamente, mas não consegue distribuir investimentos de ordem básica como educação, saúde, moradia, subsistência alimentar, entre outros.
Precisamente o que impede o crescimento brasileiro mais distributivo é a falta de investimentos em educação, ciência, tecnologia e inovação. Percebe-se um imenso crescimento quantitativo da educação e pesquisa no Brasil, mas que ainda não se traduz em efetivas práticas qualitativas. Com efeito, a utilização de tablets, não se configura apenas em uma mudança de suporte documental e bibliográfico, mas principalmente na construção de uma ideia carente de sustentação de que "o livro vai acabar" como se o suporte fosse determinante para o fim do livro.
Evidentemente que este texto não tem o objetivo de fechar a discussão sobre o assunto, mas serve como ponto de reflexão para ampliar o debate, especialmente no que tange a noção de valor de documento e valor de informação. O que deve estar em jogo como elemento produtivo da educação é o valor de informação, pois é ele quem trará benefícios reais para o crescimento educacional em termos de posicionamento crítico, reflexivo e produtivo. Em outras palavras, documentos não lidos, não compreendidos e não incentivados não se configurarão em práticas informacionais, mas sim como práticas simplesmente obrigatórias e forçosas (práticas mais frias).
Assim, finalizo com a frase de Gandhi quando afirma que "Você não precisa queimar livros para destruir uma cultura. Basta fazer com que as pessoas parem de lê-los". Historicamente, essa tem sido uma das máximas da educação brasileira.