Extensão universitária no Brasil: a necessidade de olhares mais atentos



A atividade de extensão universitária está consagrada no artigo 207 da Constituição Federal que dispõe “As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial e obedecerão ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”. Porém, é preciso entender que esse tripé não pode ser analisado isoladamente. Isso mostra a questão da interdependência de Ensino, Pesquisa e Extensão. São áreas autônomas, mas ao mesmo tempo precisam uma da outra para o desenvolvimento da atividade com mais eficiência.


No caso do ensino precisar da pesquisa, é o caso de que o conteúdo precisa ser bem transmitido, além de estar em constante renovação e adequação às condições de mercado e da sociedade. Um ensino sem uma pesquisa constante apresenta sinais de monotonia, apatia, ou mesmo superficialidade. Já com relação ao ensino precisar da extensão se refere a possibilidade que esta oferece aquela para que o conhecimento seja levado de maneira aplicada a realidade da sociedade. Em outras palavras, o ensino necessita da extensão para levar seus conhecimentos à comunidade e complementá-los com aplicações práticas. A extensão precisa do ensino para se fazer expressar diante de sociedade, bem como da pesquisa para desenvolver um processo de problematização, reflexão e solução das causas. A pesquisa, por sua vez, tem sua dependência no ensino no que tange a possibilidade de inovações, nova problematizações e reflexões, assim como da extensão para aplicação dos seus estudos, visando saber se está sendo bem desenvolvido. Por isso, essa proximidade latente entre esses três pilares de sustentação da universidade.

Agora, a pergunta que não quer calar: por qual motivo o ensino e a pesquisa são tão valorizados no meio acadêmico, enquanto a extensão é relegada a um plano inferior? O motivo principal é que o ensino e a pesquisa na percepção mercadológica, acadêmica, intelectual e produtiva propiciam resultados e um grande retorno para as universidades, para o Estado e para as empresas privadas (uma das principais parceiras das universidades no fomento à pesquisa), enquanto a extensão gera gastos que comumente não dão tanto retorno financeiro para as instituições de nível superior.


A valorização do processo de ensino e especialmente da pesquisa em detrimento da extensão nos fazem refletir sobre o tripé ensino – pesquisa – extensão. Na verdade, esse tripé não deve existir de maneira isolada, mas sim de forma interligada, pois como mesmo comentamos ensino, pesquisa e extensão são interdependentes e para se fortalecerem, precisam de atividades aproximadas e interligadas. O estudioso Pedro Demo assinala que uma atividade acadêmica, para se constituir como promissora deve ser articulada e integrada a fim de que possa alcançar diversos setores da universidade (outros professores, estudantes) e em diversos espaços (sala de aula, fora da universidade, etc.). Porém, muitas vezes essa situação não ocorre.


A pesquisa possui todo um critério institucional e burocrático para ser aprovado e o primeiro deles é que qualquer projeto de pesquisa na universidade só pode ser aprovado com a assinatura e/ou coordenação de um professor que possua doutorado e seja considerado bolsista de produtividade. No setor de extensão e ensino as coisas já mudam de figura, pois o professor não precisa ser necessariamente doutor para aprovar um projeto. Esses acontecimentos criam uma profunda valorização da pesquisa diante das demais categorias acadêmicas (ensino e extensão). Logicamente que é preferível que os docentes se capacitem e cresçam no seio da academia, mas esse tipo de prática, apenas hierarquiza e estabelece uma disparidade de importância entre ensino – pesquisa – extensão, bem como entre os próprios docentes, pois há muitos professores que não possuem doutorado que estão aptos a coordenar atividades de pesquisa (formação intelectual), mas não possuem o status (formação acadêmica). Dessa forma, os docentes que não se encaixam na possibilidade de coordenar um projeto de pesquisa recorrem as atividades de extensão e ensino para mostrarem suas produções. E muitos docentes que são doutores, percebendo a desvalorização das atividades de ensino e extensão, recorrem aos projetos de pesquisa, mesmo que esses projetos sejam mais adequados para ensino e extensão.


Com relação a extensão para se fazer uma atividade neste setor, os critérios são um tanto quanto confusos. Para se enquadrar numa proposta de extensão o docente pode partir basicamente para os seguintes tipos de atividades: Programa, Projeto, Evento, Curso, Prestação de Serviço e Produção e Publicação. Até aí tudo bem, mas o grande agravante é que os próprios órgãos da educação não delimitam o significado de cada tipo de atividade. Por exemplo, qual a diferença entre Programa e Projeto? A priori, é concebível que o Programa é mais amplo do que o projeto, haja vista que constitui uma atividade planejada e que não tem um fim programado ou que o término está longe de ocorrer, enquanto o projeto é uma atividade com programação definida e com a finalidade melhor definida. Porém, é difícil encontrar um critério específico por algum órgão educacional como o MEC ou as próprias Pró-Reitorias de Extensão (PROEx) que caracterize essas diferenças entre os tipos de atividades de extensão. Agora, muitos professores optam pelo Programa, pois nos editais de concursos para o envio das atividades extensionistas, normalmente os Programas são mais valorizados e estipulam uma premiação mais alta.


Por isso, entendemos que é necessário repensar as práticas acadêmicas, as produções dos docentes e discentes. Pensar as atividades acadêmicas de forma isolada é no mínimo mostrar que a universidade brasileira ainda não está madura para compreender os processos científicos, sociais, mercadológicos, cotidianos e humanos que a norteiam. Mesmo que um projeto seja estipulado como ensino, pesquisa ou extensão é preciso que esses fatores estejam intimamente ligados, tanto para o crescimento do projeto, como para uma satisfação do público que será contemplado. Pensar também as atividades acadêmicas apenas pela hierarquização em detrimento da intelectualidade e aplicabilidade de idéias é considerar que o tripé ensino – pesquisa – extensão está posto simplesmente para estabelecer uma disparidade no valor e no sentido de uma produção acadêmica.


Enfim, é preciso um olhar mais atento para a extensão, visando diminuir essas disparidades de valores e importância nos projetos desenvolvidos para que a universidade seja vista realmente como um espaço democrático de produção e valorização a partir da capacidade do indivíduo e não apenas pelo seu status. É preciso mostrar também que as atividades de extensão bem planejadas e bem executadas permitem à universidade socializar e democratizar os conhecimentos dos diversos cursos e áreas, e também preparar seus profissionais, não somente com a estratégia do ensino-transmissão, mas complementando a formação com a estratégia do ensino-aplicação criando uma ligação natural com o ensino e a pesquisa de modo dinâmico, criativo e inovador.

Jonathas Carvalho

Para mais informações sobre extensão universitária, eis alguns textos:

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