Uma crítica a realidade educacional brasileira baseada no pensamento de Paulo Freire


A educação é um dos mecanismos mais eficazes para a concretização de um desenvolvimento social, político, econômico, cultural e tecnológico, propiciando um grande teor de igualdade. Talvez, seja por isso que os investimentos nesse setor são tão ínfimos. Paulo Freire é um dos grandes intelectuais que delineiam um novo método educacional, visando ir além da alfabetização, ou seja, dinamizando uma conscientização no indivíduo. Isso implica dizer que a alfabetização não era o objetivo precípuo, seria apenas o limiar de um processo de conscientização política, onde o indivíduo iria reconhecer a sua condição na realidade social e tentar transformações.


A sua perspectiva educacional assinalava que a educação não poderia ser hierarquizada, nem fragmentada, isto é, o professor emite as informações e os alunos recebem de forma isolada, sem uma contextualização ao estudo da realidade. Seria preciso uma intrínseca relação entre educador - educando para que ambos ascendessem numa visão mais ampla da conjuntura social, política, econômica, cultural, dentre outros aspectos do Brasil e do mundo, pois como dizia Paulo Freire: “Quem ensina aprende ao ensinar, quem aprende ensina ao aprender”.

A necessidade de uma educação voltada para as massas é a perspectiva trivial do desenvolvimento igualitário e da conscientização dessa classe. Todavia, para que isso seja possível, é preciso um trabalho árduo nas comunidades e que estejam agregados de valores políticos, sociais, vez que as relações sociais permitem uma quebra dos paradigmas voltados pra uma educação conivente com o sistema elitista, capitalista. Para tanto, é necessária visão política, que possibilitará a limiar alfabetização e ulterior conscientização. Segundo Paulo Freire essa conscientização era a libertação cultural do indivíduo, mas o que isso significa?


Para este grande educador, existe uma dualidade que precisa ser quebrada efetivamente, que é a relação opressor e oprimido. Esta tem desenvolvido os seus métodos educacionais, a fim de que essa condição permaneça e que o oprimido não busque alternativas de transformações e a classe opressora ofusca as possibilidades de conscientização, visando a sua libertação, o seu conhecimento da realidade, buscando a sua transformação.


A educação não pode apenas basear-se num caráter informativo, pois é condição essencial imposta pelas elites: a informação é assaz eficiente para que o indivíduo esteja inserido na sociedade de modo a poder participar de suas atividades. Existe a necessidade premente de questionamentos mais amplos, onde a escola esteja viabilizada numa educação voltada para as massas. Podemos denominar essa educação para as massas, num processo de “Educação Revolucionária”, visto que o método Paulo Freire não se restringiu ao Brasil, nem a escola, mas foi ao Chile e Peru, bem como procurou mobilizar as massas, mormente os sindicalistas e as comunidades mais sofridas. Assim, pode-se afirmar que malgrado aos investimentos em projetos de leitura e/ou bibliotecas, se não houver uma conscientização no processo de educação nas comunidades que estejam sendo implantadas, será apenas mais uma ação de caráter mantenedor das elites.


Para as mudanças tão almejadas é preciso uma práxis que mobilize a sociedade em prol dos valores da maioria. Mas o que seria essa práxis? Será que podemos considerar uma simples ação uma práxis? Esta, para ser efetivamente reconhecida, necessita de grandes objetivos e estruturações para que haja maior possibilidade de êxito. Os seres humanos estão amiúde envidando suas ações, não significando, porém, que seja uma práxis, pois muitas não têm as suas perspectivas bem delineadas. Primeiramente pelo fato de muitas ações serem eminentemente individuais, atentando que as relações pedagógicas (digam-se também sociais e políticas) ascendem eficazmente de forma coletiva. Em segundo lugar, as ações educativas, como já mencionado precisam ir além, além da alfabetização, buscando uma conscientização, que se caracterizaria como sendo a práxis, pois libertaria culturalmente o indivíduo da “opressão”.


Com efeito, quão intensas e grandes são as dificuldades de uma compreensão lata e comedida da questão, pois a sociedade brasileira, em seu contexto majoritário, inclusive educadores e aqueles que têm afinidades com a área não atentaram que as ações educativas só poderão ter pleno êxito com as várias visões supramencionadas anteriormente. Visão política, social, cultural, da realidade histórica, enfim visão ampla da sociedade é um indício de conscientização que precisa ser transmitida as massas.


Ao que me parece, inúmeros são os motivos pelos quais não se despertou essa mobilização em prol de uma educação voltada para as massas. Um deles é o governo. Geralmente voltados para os interesse da elite nacional e mormente internacional, representadas por órgãos privados e empresas multinacionais, estes “instauram seus interesses no Brasil”, deixando o setor majoritário da população do país em situações eminentemente complicadas. Isso pode ser comprovado na desigualdade social, na fome, miséria, visto que esses órgãos com a complacência do governo, não investem na educação, visando uma conscientização do indivíduo, mas tão somente uma alfabetização incipiente para as mudanças nas relações pedagógicas.


Outro fator essencialmente importante são os interesses de classe e o individualismo da sociedade. Várias classes quando se mobilizam não verificam a perspectiva de corroborar com a sociedade forma mais ampla. Desse modo, prefere fechar o seu movimento, sem atentar para causas mais amplas que poderiam beneficiar outras classes e o contexto majoritário da sociedade. A educação precisa de coletividade, de superação dos interesses de classe e da individualidade. Os projetos educacionais não podem mais ser voltados apenas para a alfabetização. Estes têm de adquirir uma visão inicial do processo que chega a seu ápice na concretização da conscientização da comunidade. Sabidamente isso não é fácil, dado que muitos não têm o que comer, segundo Karl Marx, atividade sumária para o desenvolvimento de outras atividades.


Destarte, percebe-se a necessidade de concatenar as questões educativas além das sociais, políticas e culturais (embasamento da práxis) também a de subsistência alimentar (suprimento vital para o início do processo de alfabetização e conscientização para libertação. O setor intelectual da sociedade precisa perceber que a educação é um fator vital para a autonomização política do Brasil. A luta não pode cercear-se apenas aos partidos políticos e sindicatos, mas esse precisa estar presentes na educação das crianças e jovens, mas não de maneira alienativa, ou seja, buscando apenas a filiação partidária e um fechamento político, mas uma abertura que supere os interesses de classe e pessoal, a fim de mobilizar-se contra a classe dominante e quebrar essa relação opressor e oprimido, mas antes é preciso superar aquelas barreiras: intelectual e ignorante, educador e educando (deixando de ser hierárquica).


É preciso, como diria Paulo Freire, denunciar a estrutura política elitista, no caso a capitalista e anunciar uma nova perspectiva. Para ele, isso era ser utópico, mas muitos levam a utopia como algo irrealizável, mas Paulo Freire acreditava que a utopia era justamente o pensamento contrário aos interesses das elites. Ele afirmava que, para um envolvimento efetivo na educação, era necessário afinidade, vontade lutar por aquela causa. Não adiantaria ter uma formação na área, se os intelectuais edificassem uma grande barreira que os separassem das massas e fizessem daqueles grandes teóricos, sem uma efetiva práxis e destes oprimidos.


Qual a conjuntura da realidade educacional brasileira? Será que ensinar as crianças a ler e escrever quando muitas nem têm o que comer, é suficiente? Será que alfabetizar é o todo da relação pedagógica? Será que as elites não manipulam, ou melhor, investem de atos imperiosos contra ela, a fim de que as massas não tenham uma visão estruturada da realidade? Como se encontra a educação secundarista e superior? A primeira declina face aos pífios investimentos do governo, sem materiais para o aprendizado e o ensino, baixos salários, escolas sem infra-estrutura e sem superestrutura (sem visão humanizante). A prova cabal disso é que muitos que terminam o Ensino Médio, não vão desenvolver a vida intelectual, sendo praticamente forçado a trabalhar toda uma vida, recebendo salários baixos, aprendendo a ser individualista, sem corroborar com a sociedade, pois concatenando a análise ao Ensino Superior, como pode haver uma perspectiva educacional efetiva para as massas, se o nosso processo de entrada na Universidade é um vestibular.


Será que uma prova vai determinar os conhecimentos do estudante? Há uma concorrência muito grande em diversos cursos, impossibilitando a entrada de futuras capacidades das áreas. O sistema não está preocupado que o aluno não entre na Universidade, ou que entre em cursos que não tenha a mínima afinidade, ou mesmo que o abandone por falta de condições financeiras. Como falar em formação educacional, se o nosso método de avaliação é subserviente as elites? Se não está preocupado com as massas? Suprimindo os direitos estabelecidos constitucionalmente, sendo que estes são descaradamente violados?


Finalmente, é necessária a participação dos intelectuais, visando a conscientização das massas, pois que fique bem claro: o intelectual não é somente aquele que adquire ou absorve grandes conhecimentos, mas sim aquele que os seus conhecimentos, consegue aplicá-los e corroborar para a conscientização do contexto majoritário da sociedade. Isso implica dizer a completude do intelectual, ou seja, o compartilhamento do que aprendeu com a sociedade, a sua preocupação e o pensamento com a coletividade. Não precisamos necessariamente adquirir uma formação na área de Educação, mas precisamos atentar para a necessidade desta como sendo fundamental para as mudanças sociais, políticas, culturais, visando uma maior igualdade na sociedade brasileira. Paulo Freire não foi somente educador, mas também um expoente dos conhecimentos históricos, políticos, sociais, filosóficos, a fim de aplicá-los e fazer do seu método algo humanizante, ou seja, que se preocupasse com o homem, ou mais diretamente com a sociedade.

Jonathas Carvalho

blog comments powered by Disqus